O Globo em 03/06

Por Talita Duvanel

Em torno dos tradicionais frascos coloridos de esmaltes há uma série de ideias preconcebidas: o vermelho é sexy; o nude, elegante; o branco, inocente. E por aí vai. Mas dentro de cada vidrinho existem também vários elementos que não são passíveis de opinião nem de construção social: substâncias que a ciência já sabe que fazem mal ao corpo e ao meio ambiente. Por isso, a turma antenada em sustentabilidade e em beleza natural elegeu tal produto como inimigo número um do nécessaire verde. “Um esmalte é, basicamente, uma combinação de resinas plásticas, solventes e pigmentos. É uma mistura de muitos elementos sintéticos e ruins, por isso sempre brinco dizendo que é quase uma tinta acrílica de parede”, diz a dermatologista Patrícia Silveira.

Não à toa, ele é um dos produtos que mais causam irritações na pele, principalmente pela presença de solventes como dibutilftalato (DBP), formaldeído e tolueno (esses dois últimos com potencial cancerígeno). “Raramente, a alergia aparece na unha ou no dedo. Ela costuma surgir na pálpebra ou no pescoço, áreas de pele mais fina e que a mão está sempre encostando”, explica Patrícia. “A pessoa acaba achando que é uma reação, por exemplo, à maquiagem. Mas não é.”

Cientes dos malefícios das composições tradicionais e fazendo de tudo para não perder consumidores (segundo dados da agência de pesquisa Euromonitor, o mercado brasileiro de produtos para unhas movimentou cerca de R$ 1,9 bilhão em 2018, sendo o maior do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos), marcas de cosméticos têm lançado um grande leque de opções até “5free” (muitos deles com a palavra hipoalergênico no rótulo), ou seja, sem os cinco componentes mais perigosos, que, além de interferirem na saúde, acumulam-se no ambiente aquático de forma tóxica.

As pesquisas em relação a ingredientes menos tóxicos e mais sustentáveis também segue a todo vapor para atender a quem está preocupado com o futuro. Um exemplo é o que acontece no laboratório de nanotecnologia do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, em Campinas. “Uma das nossas análises é o uso de materiais, como nanocelulose, em cosméticos, algo bastante promissor por ser sustentável e aparentemente não ter tanta toxicidade”, explica a pesquisadora Juliana Bernardes, que acredita, nos próximos anos, poder usar esses ingredientes em produtos como esmaltes.

Enquanto a química verde ainda não traz produtos para unhas definitivamente naturais, tem gente pouco disposta a esperar e que já aboliu de uma vez por todas o esmalte da vida. É o caso da consultora de imagem carioca Gabriela Ganem, de 32 anos, que há dois excluiu esmaltes de sua rotina. “Você não precisa ter a unha pintada para que ela seja bonita. Ela pode estar lixada, hidratada”, diz Gabriela, que tomou tal decisão por causa da vontade de ter um visual mais natural e por consciência social. “Nunca tive alergia, mas comecei a ter questões com a toxicidade, pensava nas manicures o dia inteiro aspirando aquilo, o que me deixou mais convicta em não usar nada.”

O primeiro passo não é tão dolorido nem tão impossível assim.

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