Por Tilt UOL em 24/05/2021

Uma equipe de pesquisadores do CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais) conseguiu desvendar a estrutura completa do vírus Mayaro, descrevendo características inéditas e fundamentais. Essa é a primeira vez que uma estrutura viral é completamente elucidada no Brasil e na América Latina.

O vírus desvendado é responsável pela Febre do Mayaro, uma doença endêmica transmitida por mosquito e com sintomas muito parecidos com os da Chikungunya, o que prejudica o planejamento de estratégias de controle. As pessoas infectadas sentem dores nas articulações que podem durar meses.

Os cientistas envolvidos no estudo são do LNBio (Laboratório Nacional da Biociências) e do LNNano (Laboratório Nacional de Nanotecnologia), ambos do CNPEM.

O trabalho revelou detalhes inéditos da estrutura do vírus, com resolução de 4.4 angstrom, ou seja, aproximadamente 100 mil vezes menor que a espessura de um fio de cabelo. Publicada pela revista “Nature Communications”, a pesquisa contou com a participação de 20 pesquisadores e durou cerca de três anos e meio.

“Neste trabalho descrevemos a partícula infecciosa do vírus Mayaro, incluindo todas as proteínas que o compõem. Foram usadas técnicas que permitiram observar detalhes da biologia do vírus que não tinham sido descritos em outros trabalhos, e que representam um avanço em nossas capacidades de combate e entendimento da doença”, explicou, em nota, Rafael Elias Marques, pesquisador do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais.

Agora, os pesquisadores vão utilizar o Sirius, uma das mais avançadas fontes de luz síncrotron do mundo, projetada e construída por cientistas do CNPEM, para realizar experimentos que podem ajudar no avanço de pesquisas sobre o mecanismo de infecção, não só da Febre do Mayaro como de outras doenças virais que atingem a população brasileira.

Além disso, será possível estudar novas terapias e desenvolver estratégias para diagnóstico.

O acelerador de partículas Sirius - Henrique Grandi/UOL - Henrique Grandi/UOL

O acelerador de partículas Sirius Imagem: Henrique Grandi/UOL

Como foi feito?

Uma das principais técnicas adotadas foi a criomicroscopia eletrônica, método que permite enxergar a estrutura atômica tridimensional de moléculas biológicas. Essa técnica vem sendo amplamente empregada para compreender detalhes do SARS-CoV-2, responsável pela covid-19.

A pesquisa mostra como o vírus se organiza e como suas proteínas interagem para atingir esta organização. “Quando conhecemos em detalhes as proteínas que compõem a estrutura de um vírus conseguimos diferenciá-lo de outros vírus existentes, colaborando para o desenvolvimento de um diagnóstico mais específico da doença”, explicou o pesquisador do CNPEM Helder Ribeiro.

Um dos detalhes que chamou atenção na estrutura do Mayaro são as cadeias de açúcares ligadas à proteína E2. A configuração foi apelidada de handshake (aperto de mãos, em inglês), por se assemelharem com um aperto de mãos.

Dois açúcares (em laranja) apontando um para o outro e formando o que foi apelidado de "handshake" - Divulgação - Divulgação

Dois açúcares (em laranja) apontando um para o outro e formando o que foi apelidado de “handshake” Imagem: Divulgação

Por que é importante?

Os pesquisadores acreditam que esses açúcares, além de serem reconhecidos pelo sistema imunológico, podem ajudar o vírus a se organizar e ficar mais estável.

Além disso, a pesquisa descreve como o vírus se organiza e como suas proteínas interagem para atingir esta organização, o que é importante para entender seu ciclo de replicação e eventuais vulnerabilidades que podem ser alvo de novos tratamentos.

Errata: o texto foi atualizado
Uma versão anterior deste texto exibia, após o sétimo parágrafo, uma foto erroneamente descrita como sendo a do acelerador de partículas Sirius. Era, na verdade, uma foto do antigo acelerador usado na Unicamp e que já não está mais em funcionamento. Trocamos pela imagem mais recente do acelerador correto.
Diferentemente do informado, o Sirius não ajudou a desvendar a estrutura do vírus Mayaro. A técnica usada foi a criomicroscopia eletrônica. O Sirius será usado para ajudar os cientistas a avançar em pesquisas sobre o vírus a partir do que foi descoberto sobre ele. O erro foi corrigido.

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