Assessoria de Comunicação em 22/03/2022
Protótipo desenvolvido no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) usou recursos sofisticados para avaliar eficiência do dispositivo
Os sensores vestíveis (weareables) estão cada dia mais presentes na vida de pessoas que usam dispositivos eletrônicos para monitorar a frequência cardíaca durante atividades físicas, qualidade do sono, entre tantos outros padrões sensíveis para a saúde humana.
Dispositivos semelhantes estão sendo projetados para usar conhecimento e tecnologia para aprofundar o monitoramento da saúde das plantas em busca de aplicações úteis para a agricultura de precisão.
Os sensores vestíveis são uma estratégia promissora para determinar a perda de conteúdo de água (LWC) das folhas, pois podem fornecer quantificação no local e não destrutiva da água presente no seu interior a partir de uma única medição. Como o teor de água é um marcador importante da saúde das folhas, o monitoramento em tempo real pode fornecer informações valiosas para orientar o manejo na agricultura de precisão, bem como para estudos de toxicidade e desenvolvimento de novos insumos agrícolas.
“Os sistemas convencionais têm limitações porque são baseados em sistemas por imagem, satélites e drones. Eles precisam que a planta atacada por uma doença apresente sinais fenotípicos ou indícios visuais para gerar alertas no monitoramento. Em culturas como a da soja, por exemplo, a alteração de coloração pode ocorrer apenas tardiamente, já sinalizando um estágio irreversível de doenças como a ferrugem-asiática”, explica o pesquisador Renato Sousa Lima.
Apesar dos avanços tecnológicos nessa área, a fabricação de eletrodos adequados para monitoramento de plantas carrega desafios. Os materiais precisam ser leves, flexíveis e capazes de aderir à superfície das folhas, recobertas de tricomas, pelos que as protegem de insetos e contribuem para redução da perda de água. Além disso, precisam ser biocompatíveis, ou seja, não podem prejudicar os processos biológicos de desenvolvimento das plantas.
A superação de todos esses desafios a partir de um dispositivo foi descrita no artigo Biocompatible Wearable Electrodes on Leaf Toward On-Site Monitoring of the Water Loss from Plants publicado recentemente no periódico ACS Applied Materials & Interfaces e foi selecionado para integrar um volume especial da revista dedicado a jovens pesquisadores de todo o mundo (Special Issue: Early Career Forum).
O estudo, que usou como amostras plantas de soja e cana-de-açúcar, é resultado de um projeto de pesquisa do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), organização supervisionada pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), que mobilizou uma equipe multidisciplinar que inclui pesquisadores da Unicamp e Harvard, especialistas e recursos do Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), do Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR) e a estação de pesquisa Carnaúba do Sirius, sob responsabilidade do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). Além do MCTI, financiaram a pesquisa, a FAPESP e o CNPq.
O dispositivo
O dispositivo desenvolvido no CNPEM usa um eletrodo obtido por litografia. Uma peça única recoberta por um filme fino de níquel fixado com ajuda de um adesivo do tipo micropore.
Por esse eletrodo é aplicado um campo elétrico gerando um capacitor.
A polarização dos íons de nutrientes presentes na água revela com muita sensibilidade mínimas variações de impedância, ou resistência elétrica, que têm relação com os níveis de hidratação da planta.
“Se tem mais água, tem mais íons, você carrega mais o sistema, então a impedância diminui. Se tem menos água, menos íons, você carrega menos o sistema e a impedância aumenta”, exemplifica Lima.
Ferramentas de Machine Learning ajudaram a selecionar, dentro de um amplo espectro de frequências, apenas as mais adequadas para criação de uma equação matemática simples. Essa equação possibilitou o monitoramento da perda de água de soja em diferentes condições de microclima, a 30 e a 20°C.
A aquisição de dados coletados pelos dispositivos é feita por bluetooth, com ajuda de um smartphone, o que permite automatização de leituras e monitoramento remoto, pela internet.
Inovação patenteada
As principais vantagens do dispositivo desenvolvido no CNPEM são a portabilidade, a autonomia de bateria (10 dias), sensibilidade, biocompatibilidade e segurança na aquisição de dados, que permitem automatizações essenciais para o monitoramento remoto. Como não existem sensores similares no mercado, o depósito de patente já está em andamento.
Os métodos de fabricação do dispositivo são bem conhecidos e já estão disponíveis mesmo em indústrias de pequeno porte, o que cria condições de escalabilidade da produção e potencial redução do preço final caso alguma empresa se interesse pela tecnologia e decida transformar em produto.
Sirius
O estudo usou alguns dos mais sofisticados recursos, como técnicas de uso de luz síncrotron, para avaliar em profundidade as condições de biocompatibilidade dos sensores nas folhas.
Na estação de pesquisa Carnaúba, do Sirius, acelerador de elétrons de última geração, projetado e operado por profissionais do CNPEM, medidas de espectrometria atestaram a não interferência do dispositivo no metabolismo das folhas de soja e cana-de-açúcar.
Técnicas convencionais não permitiriam medir as concentrações de nutrientes com a sensibilidade e precisão necessárias para garantir a biocompatibilidade.
“Em folhas saudáveis os íons de zinco, manganês, cálcio e ferro, que são nutrientes fundamentais tanto para a parte estrutural quanto para o transporte, obedecem a uma estrutura morfológica, semelhante à dos capilares, xilemas e floemas. Quando a folha é afetada, as células se rompem e não existe mais nenhum padrão”, explica Lima.
Próximos passos
No atual estágio de desenvolvimento o dispositivo se mostra bastante eficiente para uso em ambientes controlados, mas também é muito promissor para monitoramento em ambientes externos. Parcerias com a indústria podem trazer diferentes demandas de aperfeiçoamento.
“O dispositivo demonstrou alta sensibilidade para o avaliação da eficiência do uso de algumas técnicas de manejo ou impacto do uso de insumos, bem como para potencialmente monitorar as condições de produtividade das lavouras. Acreditamos que com pequenas adaptações poderia contribuir também como recurso adicional no monitoramento das condições toxicológicas do campo “, avalia a pesquisadora Julia Adorno Barbosa.
Sobre o CNPEM
Ambiente sofisticado e efervescente de pesquisa e desenvolvimento, único no Brasil e presente em poucos centros científicos do mundo, o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) é uma organização privada sem fins lucrativos, sob a supervisão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). O Centro opera quatro Laboratórios Nacionais e é o berço do projeto mais complexo da ciência brasileira – Sirius – uma das fontes de luz síncrotron mais avançadas do mundo. O CNPEM reúne equipes multitemáticas altamente especializadas, infraestruturas laboratoriais globalmente competitivas e abertas à comunidade científica, linhas estratégicas de investigação, projetos inovadores em parceria com o setor produtivo e formação de investigadores e estudantes. O Centro é um ambiente impulsionado pela pesquisa de soluções com impacto nas áreas de Agricultura, Saúde, Energia, Ambiente, Novos Materiais, entre outras. A partir de 2022, com o apoio do Ministério da Educação (MEC), o CNPEM expandiu suas atividades com a abertura da Ilum Escola de Ciência. O curso superior interdisciplinar em Ciência, Tecnologia e Inovação adota propostas inovadoras com o objetivo de oferecer formação de excelência, gratuita, em período integral e com imersão no ambiente de pesquisa do CNPEM.